Maria Mariá: uma mulher em movimento!
Era 25 de fevereiro de 1353. Contra sua própria vontade, a jovem princesa francesa de apenas 14 anos Branca de Bourbon (1339-1361) chegava com seu séquito, chefiado pelo Visconde de Narbona, ao Reino de Castela para se unir em matrimônio arranjado com o rei Dom Pedro I de Castela, de apenas 19 anos. Entretanto, ele estava distante, tanto física quanto emocionalmente. Se encontrava bem longe dali, em Torrijos, ao lado de sua amante Maria de Padilla (1334-1361), da mesma idade e prestes a dar a luz ao primeiro dos quatro filhos que teria como amante do monarca espanhol, todos frutos de um genuíno e tórrido romance que até hoje serve de arquétipo para o amor latino visceral, daquele que expande os prazeres da carne à conexão de almas.
Ao longo oito anos, Branca, que ascenderia ao título de Rainha de Castela, precisou engolir em seco toda vez que o enfeitiçado Pedro, mesmo se tornando um competente autocrata que soube fortalecer os laços do seu país com a França, a repudiava em favor de sua amada, verdadeira pedra no sapato da primeira enquanto potente influenciadora do rei tanto no âmbito político quanto nos aspectos da vida mundana. Em linguagem contemporânea, a astuta, sedutora e firme Maria Padilla foi, em sua breve trajetória, uma mulher empoderada até morrer aos 25 anos como vítima da pandemia de peste bubônica poucos meses após Branca, envenenada para que saísse do caminho do casal.
Inconformado com a morte prematura da amada, Pedro I não fez por menos: declarou que sua primeira e única esposa havia sido Maria Padilla, com quem tinha se casado secretamente em Olmedo, e, com o apoio da Corte, não encontrou resistência do Arcebispo de Toledo em dissolver o casamento com Branca, considerando Maria Padilla como legítima rainha post-morten em inédito caso de ressignificação de uma das mais surpreendentes mulheres da História Medieval Hispânica. O resultado? A transferência de seus restos mortais para a Capela dos Reis na Catedral de Sevilha.
É nesse território da passagem, entre o mito ibérico imortalizado em obras da literatura, audiovisual e música, e sua presença enquanto mulher livre na umbanda e no candomblé, dona de si, atirada e liberta das castradoras convenções morais judaico-cristãs, que a Santa Resistência traz à passarela da São Paulo Fashion Week, em sua quarta participação no evento, a presença contagiante de Maria Padilla como tema da nova coleção. Em “Maria Mariá – mulher em movimento”, Mônica Sampaio sintetiza todas as Marias – nome mais popular do Brasil que resume aquelas que amam, brigam pela sua paixão e fazem do seu lugar de fala a transgressão, obstinação e sedução.
Repleta de maxi flores bem femininas, em tecidos que exalam os aromas de azeite e perfumes calientes, e nas cores que resumem a essência da Espanha – vermelho e preto –, a nova coleção da Santa Resistência é um sopro de paixão, de fascínio e encantamento por este país da Península Ibérica em sinestésica mélange que evoca imagens, notas aromáticas e sabores em sintonia com a brasilidade.
Com a participação da outrora modelo e hoje cantora lírica e de jazz Nádia Figueiredo interpretando uma sevillana fora da sua zona de conforto, mas absolutamente sintonizada com o tema, do músico Fabio Nin e uma catwalk que, além do time de top models femininas e masculinos, ainda inclui a veterana 60+ dos desfiles Veluma – única top preta no Brasil dos anos 1970/80, do babalorixá, antropólogo e doutor em ciências sociais pela PUC/SP Rodney William e o “exu do Salgueiro” Demerson d’Álvaro – o desfile pretendeu resgatar a beleza da passarela sem artifícios que tiram a atenção da coleção.
Vinda de uma família do Recôncavo Baiano e filha de um físico nuclear, Mônica Sampaio faz parte da nova geração de mulheres pretas maduras do Brasil, tendo construído uma carreira bem-sucedida ao longo de duas décadas. De engenheira-eletricista da Varig à executiva de multinacionais e com passagem pelo Exército, no qual chefiou a seção de Engenharia do Hospital Central do Exército no Rio de Janeiro, Mônica, aos 45 anos, ressignificou sua vida ao abraçar a nova carreira que decidiu seguir, dando vazão ao sonho de ter marca relevante na moda. Hoje, aos 60, caminha para se tornar uma das grifes mais emblemáticas do SPFW enquanto criadora de moda autoral inclusiva, plural e diversa, que abraça questões como identidade, liberdade de corpos e antietarismo em sintonia com a afirmação de uma moda brasileira com ingredientes multiculturais.
“Fui muito feliz sendo engenheira, profissão que me permitiu rodar o mundo, mas, desde cedo, criava minhas próprias roupas, pois não me sentia representada naquilo que existia. Sou uma mulher negra, em diáspora, que faz uma moda global”, diz Mônica Sampaio.
Ficha Técnica:
Direção Criativa: Mônica Sampaio @santaresistencia @monicabsm50
Direção Artística/Stylist: Alexandre Schnabl
Direção de Passarela: André Vagon @andrevagon
Direção de Casting: Scena Lúdica
Beauty/ Hair: Wilson Eliodorio
Produção executiva & backstage: Junio Lima e Victor Cinquini @jllima_ @victor.cinquini Relações Públicas: Victor Cinquini @victor.cinquini
Camareira: Edna Lima @ednafashion_
Modelistas: Railda Costa @railda.c Íris Azevedo @iris.azevedo.925 Laila Miranda @lailarmiranda
Costureiras: Mônica Guedes, Gilma Gomes @gfg61 Beth Castro, Margarida, Betto Gomes @bettogomesoficial e Luzia Domingues
Estilistas convidadas: Sillas Filgueira @sillasfilgueira Alle Florentino @alleflorentino_
Acessórios: Dih morais @dihmoraiss Sol e Lua @soleluachapéus Flores G Brandão @geraldabrandao
Croquis: Laertte @laerttes
Programação Visual: Phellipe Souza @phephelipe Bailarino: Renato Marques @remarques76
Assessoria de Imprensa: Scena lúdica
Agradecimentos especiais: Abacashi.com, Think Work.
BACKSTAGE:
Foto: @agfotosite
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