A cidade cheira a asfalto quente e café gelado quando o primeiro holofote corta a névoa sobre o pier. As cadeiras ainda rangem, alguém derruba um press kit, e um vento teimoso brinca com um lenço de seda como se fosse spoiler. É a senha, darling. Ui ui ui, começou a semana em que Nova York para de pedir licença e volta a ditar o compasso. Em seis dias compactos e barulhentos; desfiles enxutos, apresentações cirúrgicas, 100 e tantos eventos orbitando o calendário; a Primavera/Verão 2026 abriu a torneira do desejo com aquele DNA made in USA: pragmatismo que rende caixa, emoção que rende conversa e imagens que se instalam na retina como um refrão de estádio. Atura ou surta, bebê: a tendência é certa.
Por Fábio Lage – House of Models

O “reset” azul de uma cidade cansada do ruído
Se a temporada tivesse um cheiro, seria brisa marinha batendo em crepe de seda. O azul; do celeste lavado ao cerúleo vitaminado; apareceu como calmante público, um ansiolítico cromático que substitui o preto automático e abraça alfaiataria leve, malharia fresca e vestidos de vento. Não é só cor, mon amour de Xique-Xique; é comportamento. Depois de anos de feed saturado, a cartela “calming blues” transformou o céu em neutro de guarda-roupa, uma espécie de jeans espiritual. Michael Kors entendeu o mood com scarf-tops que flutuam e saias que desenham turbulências no ar; Tory Burch temperou o céu com choque controlado de quirk e precisão de corte; até quem jurava fidelidade ao bege piscou para esse horizonte. Azul que acalma, azul que vende, azul que vira vitrine. Abalou Bangu.

NYFW como palco de realismo mágico americano
Setembro em Nova York é um ringue com três rounds diários: manhã de apresentações, tarde de desfiles afiados, noite de eventos que alimentam o mito e as planilhas. A rota global — Londres, Milão, Paris — continua sendo a via-crúcis do prestígio, mas a cidade relembrou por que o made in NY sempre volta ao centro, mon petit de Cataguases: aqui a passarela conversa direto com o cashflow. Coach puxou o freio de mão no cruzamento Y2K (sigla para os anos 2000) com grunge limpo, tirou o pó das bolsas de arquivo e atualizou a silhueta de calça para um conforto que tem ao mesmo tempo memória e rua. Ralph Lauren, no seu universo paralelo off-calendar, entregou a América cinematográfica de sempre, mas com aquela piscadinha malandra que mantém o status de uniforme do sonho. E, no outro extremo, os laboratórios de downtown ajustaram o parafuso da vanguarda com propósito, baby: Collina Strada provou que brincar com volume não precisa excluir o uso; Luar e Area não deixam a gente esquecer que ornamento, quando não é enfeite, é argumento, mon amour!

A cultura americana entre o antibomba e o anti-vanilla
E convenhamos queridinhos; entre eleições que dividem, streaming que pulveriza, esportes que aglutinam e tecnologia que homogeneíza, a moda de NY se posicionou como um antídoto de dois ingredientes. Primeiro, o essencialismo sensual: linhas limpas, alfaiataria de ombro educado, saias com pregas que não fazem barulho, transparências pilotadas como se cada milímetro de pele fosse orçamento. Segundo, o humor útil: colares que viram porta-tudo, lenços que protegem cabelo e legenda, pompons que são ironia consciente, não infantilização da roupa, mesmo que não faça sentido para a identidade da marca. O país que inventou o branding do cotidiano redescobriu o prazer de vestir ideias sem parecer tese. Deus me free do didatismo. Aqui é punchline.

Construção, styling, casting, beleza e geografia
A silhueta abriu a janela e fugiu de casa, darling… As calças cresceram de lado e de baixo: harem, balloon, parachute… chame do que quiser, desde que a barra tenha ar. Quando a perna respira, o tronco responde: regatas de malha fria, túnicas alongadas, bodies limpos. A cintura voltou a falar alto, não em volume, mon amour de Jardim de Piranhas, mas em ênfase: cintos-faixa, nós estratégicos, cortes que conduzem o olho. O plissado ressurgiu como partitura, das saias aos casacos, midis que fazem a sombra dançar. Os materiais pediram toque, não truque: algodões técnicos que não perdem poesia, sedas que lembram água salgada, couros afinados para não pesar no clima nem no feed. Na superfície, a graça inteligente: listras que empurram o poá para a lateral (xô bolinhas), rendas pensadas para a perna (meias, saias, fendas em diálogo com forros), transparências que lembram que insinuar ainda é mais caro do que entregar.

O styling montou a ponte entre passarela e checkout. O lenço 60s… Riviera imaginária, cabeleira salva, selfie pronta… é o acessório do verão, darling Lee. O shrug, o micro-bolero que some no olhar mas resolve o dress code, reapareceu com jeitinho de “coloquei e saí”. E o golpe de mestre: os functional necklaces, colares que carregam mini-bolsas, moedas, penduricalhos com utilidade de verdade. É biju que faz P&L sorrir. A beleza destampou a aquarela: olhos em pastel leve, bocas metalizadas pontuais, pele com brilho de ventilador gelado, nails que contam a piada inteira antes da roupa. O casting manteve o compromisso com pluralidade sem paternalismo: corpos, idades e heranças aparecem como sintaxe, não slogan… quando a roupa é honesta, a diversidade é consequência, não pauta… mas falaremos ainda sobre o que foi esse casting poderoso da NYFW… aguardem o veneno, baby!

O romance do vento, a graça útil e o minimal que sabe sorrir
Mon petit de Copacabana, vamos chamar de Romance do Vento o arco que une azul, pregas e sedas líquidas. Em Michael Kors, a gente viu a América antropológica do litoral reinventada para o escritório que não exige terno, mas cobra presença. Em Tory Burch, o vento ganha quinas e torções; o vestido não é só praia, é performance social… e que performance, querides… Na outra margem, a Graça Útil dá nome à temporada dos acessórios “com carteira de trabalho” Ui, ui, ui: colares-necessaire, minibags de pescoço, cinturões que organizam a silhueta e o bolso. É o design babadeiro lembrando que, no fim do mês, a indústria vende soluções.

A terceira via é o Minimal que Sabe Sorrir. Já falamos como a Calvin Klein, sob Veronica Leoni, apresentou um desfile cerebral, quase tese acadêmica: trenchs plastificados, alfaiataria oversized, couro fosco. Uma coleção que limpou a libido histórica da marca e preferiu apostar em austeridade com lampejos de ironia… os pompons presos a ligas, por exemplo, mais comentário crítico do que sedução pop. Mas quem realmente deu consistência e desejo a esse pacto minimal foram Khaite e Altuzarra. Catherine Holstein, na Khaite, desfilou cortes afiados que encostam na pele e revelam a precisão sexy do tailoring nova-iorquino, sem nunca perder o ar pragmático de peça que vende. Joseph Altuzarra, por sua vez, soube combinar pregas e túnicas longas com sensualidade medida, provando que o rigor pode ser prazeroso quando encontra fluidez e leveza. Minimalismo, sim, mas com sorriso de canto de boca: roupas limpas, cabeça sagaz, corpo presente.

Honey Lee do céu, Brandon Maxwell torna volumoso aquilo que, na loja, costuma intimidar; Collina Strada injeta leveza autoral; Prabal Gurung… Uh la la – dá verniz de noite. A equação é honesta: volume democrático em cima de pés afiados, tops que não gritam, a cintura dita a história aqui, darling. E, para quem precisa de memória afetiva com recibo, o Moto Redux da Coach reajusta o arquivo Y2K para um 2026 com menos nostalgia vazia e mais propósito material. Denim baixo sim, mas com acabamento que segura o look na vida real; pregas que flertam com a quadra de tênis e saem para o show; bolsas-ícone revisitadas que abastecem o desejo com nome e sobrenome.

Quando a roupa discute com a própria sombra
A graça de Nova York sempre esteve na briga boa… Minimalismo contra maximalismo foi luta de UFC educada: de um lado, a roupa que aposta no corte, no azul e no silêncio; de outro, o ornamento que não pede desculpas, darling — pompons, franjas, brilho calibrado. Sportswear e alfaiataria dançaram um bolero sem vitória final: túnicas longas e calças ar revezaram com blazers de ombro ligeiro e trenchs plissados. Ah o gótico, honey Lee de Campos Elíseos… no verão, reapareceu na estratégia do “escuro ventilado”: renda, transparência, sombra. O preppy escapou da biblioteca e descobriu a rua no movimento da saia e na queda do cinto. E lá no fundo, como backing vocal, o zebra e outros prints gráficos voltaram a desenhar curvas em looks que poderiam ser minimal, não fossem as listras e as manchas que assinam… Babado!

Mercado, consumo e o eterno casamento americano entre desejo e delivery
Honey, se você escuta varejista atento, o recado foi claro: menos teorema, mais fitting. A alfaiataria leve, as pregas apaziguadas e o azul em degradês são apostas de giro. A calça balloon assusta no cabide e conquista no espelho; o truque está no tecido e no corte, e os desfiles entregaram bons protótipos. Os functional necklaces têm o tipo de ROI que faz comprador sorrir: baixo risco, alto papo de loja, storytelling pronto para provador e TikTok. O lenço 60s é a SKU (Unidade de Manutenção de Estoque) que vira tutorial, vitrine e gift em uma tacada só… custo amigo, margem feliz, honey! E nas belezas, queridinhos? Olhos pastel e a pele ventilada já estão no YouTube antes do embarque de coleção; basta a marca traduzir o mood para a bancada de maquiagem e deixar a manicure contar o resto do conto…

Música, esporte, streaming e a diplomacia do lenço
No país que mede audiência em yard, não em metro, a coleção que escala é a que conversa com o after do jogo, com a plateia da turnê, com a temporada nova daquela série que você nega assistir. Baby, o lenço no cabelo virou passaporte entre a selfie do festival e o jantar de rooftop. As pregas contam a história da quadra e da rua; a transparência pensa em tapete vermelho, mas desce para o brunch quando ganha forro estratégico. O moto redux faz ponte entre a nostalgia do Need for Speed e a prática do delivery, que exige bolsos e mobilidade. O azul é diplomata: entra no escritório boutique, na reunião híbrida, na praia urbana. E a diversidade, quando de verdade, escreve a pauta mais poderosa da América 2026: vestir pluralidade com inteligência, e não com check-list... Cata?

Quem lacrou e quem deve ficar no backstage da história
Lacrou quem entendeu o vento, honey… convenhamos. Azul sereno, pregas com intenção, calça com ar, lenço com mapa. Lacrou quem entendeu a planilha do desejo: funcionalidade que vende, humor que fideliza, precisão que seduz. Lacrou quem devolveu sexualidade à roupa sem gritar… transparência dirigida é cartel de luxo silencioso. Deve morrer na passarela aquilo que trata ornamento como muleta, não como argumento; a franja que não conversa com o passo, o pompom que não encaixa na narrativa, a transparência que não pensa na manhã seguinte. E, sobretudo, deve ficar no backstage a tese sem corpo: conceito sem fitting é palestra, não coleção. Tá na Disney‽

Manhattan, vento leste, manhã de terça
Honey Lee de Mossoró… a passarela da NYFW SS26 já foi desmontada, mas o lenço ainda voa num cruzamento do SoHo como se fosse parágrafo final. A Primavera/Verão 2026 de Nova York não prometeu revolução, prometeu relevância… e olha que cumpriu, menines? O minimalismo aprendeu a sorrir sem perder a linha. O ornamento aprendeu a trabalhar sem perder a graça. A cidade devolveu ao mundo um guarda-roupa que sabe vender sem pedir desculpas e sabe sonhar sem se explicar. O resto é tarefa nossa: traduzir o romance do vento para araras brasileiras, ajustar volumes para calçadas de sol, colocar o azul na frente da fila do pão e ensinar o pescoço a carregar histórias. Convenhamos darling Lee… a moda americana boa é isso: quando a peça vai direto do papo ao carrinho… e, cá entre nós, quando a crítica precisa admitir que amou usar…
Mon amour, respirou? Então amarra o lenço, pega teu functional necklace e vem: a próxima esquina já é tendência… te vejo em London City, honey!
Beijinhos.
Foto: Divulgação