Quando a Moda Frita os Miolos: Dystopic.core Lab na Casa de Criadores

Imagine um eclipse total, daqueles que engolem a luz e nos deixam tateando no escuro. Agora, acrescente a isso um desfile de moda que mistura Mad Max com a estética de um apocalipse urbano — e voilà! Você tem o que foi a apresentação da Dystopic.core Lab na 53ª Casa de Criadores. E não, meus amores, isso não é uma metáfora exagerada. É pura realidade distópica.

Se você ainda está pensando em primavera-verão, florzinhas e babados românticos, pode esquecer! Dystopic.core Lab não está nem aí para o que é fofo e palatável. Aqui, a proposta é outra: um mergulho nas trevas, uma caminhada no lado sombrio da moda onde o glamour convencional não tem vez. Rato Distópico, o estilista por trás dessa loucura criativa, não veio para fazer amigos, veio para balançar as estruturas do que entendemos por moda.

Os looks apresentados são um verdadeiro tapa na cara da cisnormatividade e um convite — quase uma ordem — para repensarmos o que é belo. Aqui, a beleza é suja, crua, quase violenta. Como se as ruínas da cidade fossem usadas como matéria-prima para criar um novo tipo de elegância, uma elegância que grita nas entrelinhas:

“estamos aqui e não vamos recuar!”

Vamos aos detalhes, porque a Dystopic.core Lab não está brincando em serviço. As roupas, se é que podemos chamá-las assim, são uma verdadeira arte da desconstrução. Vestidos que parecem ter sido esculpidos em material destruído, com uma estética “destroyed” que dá uma nova vida ao conceito de moda. E os acessórios? Querides, são um show à parte. Os óculos futuristas evocam o espírito de Alexander McQueen em seus momentos mais audaciosos, enquanto as unhas, afiadas como lâminas, estão prontas para cortar qualquer conceito ultrapassado de estilo e gênero.

A trilha sonora assinada por NCCO (um gênio das batidas sombrias) nos envolveu numa atmosfera que mais parecia um ritual. Cada passo, cada movimento dos modelos, era acompanhado por sons que evocavam o eco de um mundo pós-apocalíptico. Era como se estivéssemos em uma rave gótica, mas ao invés de música eletrônica, tínhamos os sussurros de uma sociedade em colapso.

Agora, querides, precisamos falar sobre o conceito por trás dessas criações. Dystopic.core Lab não está apenas colocando roupas na passarela — está lançando armaduras para que possamos enfrentar a brutalidade do mundo. Cada peça é uma declaração, um manifesto que rejeita o tradicional, que destrói a ideia de que a moda precisa ser apenas bonita e confortável. Aqui, estamos falando de uma moda que é desconfortável, que arranha, que cutuca e, acima de tudo, que provoca.

Rato Distópico, junto com sua equipe de quebrantxy e Gika Corbane, criaram uma coleção que é um verdadeiro soco no estômago. A maquiagem e o cabelo por Maxi Weber completam a estética de uma gangue de sobreviventes de um cataclismo fashion. É como se o universo de “The Walking Dead” encontrasse o avant-garde de Rei Kawakubo. E quer saber? Eu estou obcecado!

E como se já não bastasse toda essa carga de desconstrução, Dystopic.core Lab ainda nos surpreendeu com uma intervenção que rasgou de vez o véu entre plateia e passarela. No meio do desfile, modelos começaram a emergir da plateia, como que sugados pela energia densa do evento, e se juntaram aos outros na passarela. Foi uma performance que, para quem acha que já viu de tudo, foi um verdadeiro soco no estômago da monotonia.

Em um dos momentos mais impactantes, um modelo — que surgira do meio da plateia como uma sombra viva — se aproximou de mim, chegou perto, bem perto, e sussurrou em meu ouvido:

“Qual dos meus sonhos eu deixei de sonhar?”

Querides, aquilo não foi só uma pergunta, foi uma faca afiada que penetrou fundo na alma, desafiando cada conceito de conformidade que ainda restava em mim. Foi um lembrete brutal de que, no mundo de Dystopic, cada peça, cada movimento, cada olhar é uma provocação à nossa consciência adormecida.

Dystopic.core Lab nasceu da necessidade de questionar as normas. Inspirades pela vivência na periferia de São Paulo, a marca transforma o “destroyed” em algo totalmente novo — mas com um luxo que te desafia a olhar para além do óbvio. Aqui, a desconstrução é a base de uma estética que te faz questionar: o que é, afinal, o verdadeiro luxo?

Essa é a moda do futuro, uma moda que não tem medo de olhar para o abismo e dar uma piscadela. Se você acha que a sustentabilidade é só sobre tecidos orgânicos e práticas éticas, pense de novo! Dystopic está aqui para nos lembrar que a verdadeira revolução vem das margens, dos corpos que se recusam a ser silenciados, dos que transformam a destruição em arte.

Foto: Divulgação – Ag. Fotosite
Colaborou com o artigo: Arthur Hilário