O universo do casting de modelos pode parecer um mar de glamour e beleza, mas a realidade por trás das cortinas é um complexo jogo de negociações e logística. Este processo, frequentemente mais relacionado aos negócios do que à criatividade, é fundamental para a realização dos badalados desfiles que ditam tendências no mundo da moda. Vamos desvendar como funciona o casting e o papel crucial do diretor de elenco nesse cenário.
A temporada de casting inicia com uma intensa fase de pré-casting. Durante essa etapa, os diretores de elenco encontram centenas de modelos enviadas por diversas agências. Este é um momento crucial onde uma mistura de novos talentos e rostos conhecidos desfila pelos escritórios dos diretores.
“As top models frequentemente pulam essa etapa inicial, pois sua contratação é praticamente garantida”, revela uma fonte interna. As novas aspirantes entregam seus compcards – cartões de apresentação que incluem fotos e medidas – e realizam uma breve caminhada, enquanto os diretores de elenco fazem anotações e tiram fotos que serão armazenadas em um banco de dados.
No fim do dia, os cartões das modelos são cuidadosamente organizados em pilhas de SIM, NÃO e TALVEZ. Alguns diretores preferem métodos tradicionais, mantendo seus cartões em fichários divididos por agência e desfile, marcando modelos específicas para determinados shows.
Com o pré-casting concluído, os diretores se movem para a casa do primeiro estilista, iniciando a fase final da seleção. Modelos são convocadas com base na avaliação inicial, variando entre 50 a 150 por desfile. Aqui, o processo se repete com algumas diferenças: estilistas e designers estão frequentemente presentes, e os digitais (fotos digitais) das modelos são impressos e anexados aos seus cartões.
Um quadro de top picks é criado, refletindo as preferências dos diretores, estilistas e designers. “A palavra final geralmente é do estilista, mas já vi casos em que o designer também exerce uma grande influência”, comenta um insider.
James Scully, um renomado diretor de elenco, destaca a importância de adaptar diferentes elencos para cada cliente.
Depois de identificar as modelos preferidas, os diretores de elenco e seus assistentes entram em contato com os agentes para verificar disponibilidade e negociar taxas. Aqui, a experiência da modelo faz toda a diferença: enquanto uma new face pode ganhar cerca de mil dólares por desfile, uma top model pode receber até dez mil dólares.
A negociação de opções – primeira ou segunda escolha – pode ser particularmente tensa. Uma primeira opção garante prioridade à modelo, enquanto uma segunda opção significa que o diretor precisa negociar com o agente para tentar convertê-la em uma primeira opção, muitas vezes levando a conflitos.
A fase de fittings é o momento decisivo. As modelos que chegaram até aqui experimentam as roupas, e ajustes finais são feitos. Se uma modelo não se encaixa bem, ela pode ser substituída por outra.
A habilidade de negociação e a manutenção de boas relações com agências são cruciais. “Ter fortes laços com agências pode significar obter favores importantes, como a disponibilidade de modelos de topo para desfiles menores“, observa um veterano da indústria.
Porém, nem tudo é glamour no mundo dos castings. Em março de 2017, James Scully cumpriu sua promessa de nomear publicamente aqueles que se envolvem em abusos no setor. Ele foi ao Instagram para denunciar um incidente no casting da Balenciaga, onde os diretores Maida Gregori Boina e Rami Fernandes teriam deixado mais de 150 modelos esperando por três horas em uma escada escura enquanto saíam para almoçar.
A postagem de Scully causou uma tempestade na indústria da moda, levando a Balenciaga a encerrar rapidamente seu relacionamento com Boina e Fernandes. A empresa emitiu uma declaração se desculpando pelo incidente e prometeu mudanças radicais no processo de seleção.
Maida, em sua defesa, negou as alegações, chamando-as de “imprecisas e difamatórias” e transferindo a culpa para Balenciaga pelas más condições no casting. Ela afirmou que as modelos não esperaram por três horas no escuro e que a eletricidade do prédio caiu por um período de tempo.
Scully, no entanto, manteve sua posição, reforçando que o comportamento abusivo dos diretores de casting era um problema recorrente. Comentários de modelos como Judith Schiltz e Mollie Gondi corroboraram a denúncia de Scully, destacando um padrão de comportamento abusivo por parte da dupla.
O trabalho do diretor de elenco é uma dança delicada entre logística e sensibilidade estética, onde a habilidade de equilibrar as necessidades dos estilistas com as demandas das agências e modelos define o sucesso de um desfile. No entanto, como demonstrado pelo incidente na Balenciaga, há uma face sombria no mundo do casting que ainda precisa ser combatida. A verdadeira mudança virá com a união da indústria em torno de práticas mais éticas e humanas, onde o respeito e a dignidade das modelos sejam prioritários.
Foto: Reprodução
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